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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Na Mesa



Eu não sei quem decidiu criar essa coisa de linguagem verbal. Mas eu duvido que a fala tenha nascido para alertar os perigos do cotidiano. Fazer juras de amor. Recitar poemas. A fala não se desenvolveu para aperfeiçoar brigas. Nem foi criada durante uma guerra qualquer. A fala nasceu em uma mesa, durante um almoço, um jantar, ou até em um boteco.

Não conseguimos dividir comida sem dividir histórias. A mesa é nosso fraco. Baixamos a guarda diante dos pratos. Nos curvamos nas cadeiras perante os alimentos. Os talheres que seriam armas em outras ocasiões, se transformam em aliados da paz. É um momento sagrado de conexão entre o grupo. A comida abre espaço para a compreensão.

É só prestar atenção nos costumes. A mesa está presente para abrir os assuntos mais importantes da vida. É item obrigatório em sala de reunião. Grande aliada na hora de fechar negócios.

É objeto de desejo em qualquer bar. Confidente dos bêbados. Tem gente que se engana, acha que é o garçom. Mas a mesa está sempre ali no meio. É a única que se lembra da noite inteira.

Recebemos nossas visitas na mesa. È a grande anfitriã das festas e ceias. Durante anos os arquitetos tentaram convencer as pessoas a se reunir na sala de estar. Mas nunca obtiveram sucesso. A cozinha sempre saiu vitoriosa nos números. É por isso que inventaram a cozinha americana. Para tirar o pó da sala e aumentar o espaço da conversa.

A mesa é até mesmo sinal de poder. Têm algumas tão cobiçadas, que às vezes necessitam atender a uma grande fila de reservas. São tratadas como especiais. Tem vista pro mar e um cardápio com nomes esquisitos. Mas elas nunca serão realmente diferentes da mesa do boteco da esquina, que serve todos os tipos de fritura e não faz questão das toalhas limpas. Ambas querem abrir nosso apetite pela comunicação. Nosso desejo de se conectar com outro ser humano.

Não importa o local da mesa. Não importa a qualidade da comida servida. O que importa, são as pessoas. A real função da ceia não é preencher o estomago. É preencher o coração. Nenhuma vista substitui uma ótima companhia.

Publicado no jornal O Farroupilha em 14/12/12

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