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domingo, 31 de março de 2013

Chocolates


Sempre fui ansioso. É da minha natureza. Lembro que não conseguia dormir direito na noite anterior ao domingo de páscoa. Era meu feriado favorito.

Não é que eu seja fanático pelos chocolates. Eles sempre duravam meses em minhas mãos.

Eu gostava mesmo era da aventura. Acordava meu irmão e o convencia a levantar para acharmos os chocolates.

Não acreditava em Papai Noel, mas jurava que o coelhinho da páscoa era de carne e osso. Ele invadia a minha casa a noite, comia a cenoura, tomava o Nescau, e deixava bilhetes e pegadas por toda a casa.

Na época eu não imaginava que as pegadas eram de farinha e feitas pelas mãos dos meus pais. Não fazia nem idéia de que a caligrafia do coelho era exatamente igual à caligrafia do meu pai.

Até achava estranho que o coelhinho não fazia o mesmo pelas outras casas. Que somente o meu lar era o escolhido para virar uma caça ao tesouro, com pistas espalhadas dando dicas da localização de todos os chocolates que ele havia esquecido pelas gavetas e armários.

Com o tempo eu perdi a ingenuidade de criança, e descobri tudo. Mas confesso que a brincadeira não perdeu a magia. Ainda aconteceu por algum tempo. Sem as pegadas no carpete, é claro, já que elas davam trabalho na faxina. Mas com pistas cada vez mais complexas e divertidas.

A Páscoa não era a ressurreição de Jesus. Não era o chocolate. Não era o coelho. A Páscoa era o amor e a dedicação dos meus pais por mim e pelo meu irmão. Eram os detalhes. O cuidado. Tudo que eles faziam para cativar nossa imaginação e a nossa curiosidade.

Essas histórias se tornaram marcas de pura felicidade em minha vida. E só foi necessário o amor, e o tempo de meus pais para que acontecessem. Nunca precisei ganhar um chocolate importado ou um ovo gigante com um brinquedo no meio para poder sorrir. Só precisei de amor.

Agradeço aos meus pais por me ensinarem que as melhores partes da vida são embrulhadas em sentimentos.

Publicada no jornal O Farroupilha em 29 de março de 2013

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