Arrumar as malas nunca foi meu forte. Levo sempre mais tempo
do que gostaria para começar, e mais tempo do que gostaria para terminar.
Eu me perco nas roupas. Erro na quantidade. Desafio a
meteorologia. Aposto nas mangas curtas no meio do inverno, e nos casacos
grossos durante o verão. Nunca ganho, mesmo se minha aposta for a mesma que a
da previsão do tempo.
Tirar as roupas do armário e jogar na mala sempre foi uma tarefa
comum da minha vida. Mas nunca deixou de ser um ritual. É um namoro com as
camisetas. Um jantar com as calças e cuecas. Um romance com os pertences.
Não sou materialista, não me leve a mal. Mas quando revisto
o meu exterior, eu acabo me reencontrando com todas as histórias que fizeram o
meu interior.
Se foi de presente. O rosto de quem presenteou vem fixo numa
estampa invisível. O nome fica numa etiqueta que só eu consigo ver. Não consigo
evitar. Os objetos me contam histórias. Me entregam mapas que indicam onde as
linhas da vida de outras pessoas acabaram se cruzando e dando nós com a minha.
A mala é uma máquina do tempo. Quando está aberta, pode
retroceder uma vida inteira. Mas quando fecha, é futuro.
Podemos levar roupas. Fotos. Presentes. Cartas. E até mesmo
perfumes. Mas ainda não existem malas que carreguem sorrisos. Nem sacolas
capazes empacotar abraços, ou mochilas que suportem lágrimas.
Ainda bem que o coração foi inventado. Coração não tem
fundo. Cabe tudo que importa. E quanto mais cheio, menos pesa.
Cronica publicada no jornal O Farroupilha no dia 17/08/12
Cronica publicada no jornal O Farroupilha no dia 17/08/12